Entrevista – O que fazer se seu CBO estiver errado?

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redação de jornalismo

Após ler essa matéria e conferir o número da a CBO (Classificação Brasileira de Ocupações) e descobrir que ele está errado. O que fazer? Na entrevista abaixo, Pedro Henrique Curi de Oliveira, advogado trabalhista e cível do Montalvão & Souza Lima Advocacia de Negócios, responde essa e outras dúvidas, detalha o que o trabalhador deve fazer nestes casos.

QUAIS AS IMPLICAÇÕES QUE ESSA JORNALISTA PODE TER COMO ESSE ERRO DA EMPRESA?
Pedro Henrique Curi de Oliveira- O equívoco da empresa ao registrar a jornalista sob código de CBO incompatível com as atividades efetivamente desempenhadas — classificando-a como operadora de telemarketing em vez de profissional da comunicação social — enseja sérias implicações de ordem trabalhista, previdenciária e moral, que merecem análise técnica aprofundada à luz da legislação e da jurisprudência trabalhista.

O QUE ESSE ERRO VIOLA NO PONTO DE VISTA TRABALHISTA?
Pedro Henrique Curi de Oliveira- Do ponto de vista trabalhista, o erro viola o princípio da primazia da realidade, consagrado no Direito do Trabalho, segundo o qual prevalece a função efetivamente exercida pelo empregado sobre a que consta nos registros formais. A omissão ou o registro inadequado da função real pode acarretar o descumprimento de normas coletivas da categoria dos jornalistas, como pisos salariais, jornada diferenciada, adicionais específicos e direitos convencionados em acordos ou convenções coletivas de trabalho firmados pelo sindicato da categoria profissional correta. O enquadramento equivocado pode, ainda, refletir no recolhimento das contribuições sindicais de forma indevida, bem como no não reconhecimento do direito à estabilidade ou benefícios assegurados à categoria jornalística.

PODEM HAVER IMPLICAÇÕES NA ÁREA PREVIDENCIÁRIA?
Pedro Henrique Curi de Oliveira- No âmbito previdenciário, a classificação incorreta compromete o correto reconhecimento do tempo de serviço e da atividade profissional perante o INSS, impactando diretamente o cômputo para fins de aposentadoria, especialmente se o tempo de contribuição em determinada categoria exigir formação específica ou apresentar critérios diferenciados, como aposentadoria especial. A divergência entre a atividade registrada e a atividade real pode gerar, inclusive, indeferimento de benefícios ou necessidade de retificação futura, com ônus probatório deslocado à trabalhadora, contrariando o dever legal do empregador de manter registros fidedignos da relação de emprego.

HÁ AINDA OUTRAS IMPLICAÇÕES?
Pedro Henrique Curi de Oliveira- Há, ainda, implicações administrativas e financeiras, como o comprometimento do acesso ao seguro-desemprego, já que a função registrada pode não preencher os requisitos para a habilitação no benefício, gerando recusa no sistema de análise automatizada. Esse prejuízo concreto afeta o direito fundamental ao amparo social no desemprego involuntário, consagrado no artigo 7º, II, da Constituição Federal.
Além dos danos de natureza material, há evidente repercussão moral, pois a atribuição documental de função inferior ou diversa à qualificação profissional da trabalhadora constitui afronta à sua dignidade, honra objetiva e reputação profissional, podendo gerar o direito à indenização por danos morais. A desvalorização profissional, especialmente em um mercado competitivo como o jornalístico, configura situação de humilhação e constrangimento que ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano, conforme reconhecido pela jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

A EMPRESA PODE SER RESPONSABILIZADA POR ISSO?
Pedro Henrique Curi de Oliveira- Sim. A empresa pode ser responsabilizada administrativamente, nos termos do artigo 47, da CLT, que proíbe a anotação de dados falsos na CTPS ou outros documentos de registro do trabalhador. O descumprimento dessa norma sujeita o empregador à aplicação de multas e à fiscalização por parte do Ministério do Trabalho e Emprego.
Então, o erro na indicação da CBO não é um detalhe irrelevante: trata-se de uma irregularidade grave, com reflexos multidimensionais, que impõe à jornalista sérios prejuízos e ao empregador, responsabilidade objetiva pela reparação dos danos decorrentes da conduta ilícita.

O QUE ESSA JORNALISTA DEVE FAZER PARA GARANTIR SEUS DIREITOS TRABALHISTAS?
Pedro Henrique Curi de Oliveira – Para garantir integralmente seus direitos trabalhistas, a jornalista deve adotar medidas estratégicas, tanto no âmbito administrativo quanto judicial, com base na legislação trabalhista vigente, nos princípios que regem a proteção do trabalho e na jurisprudência consolidada dos tribunais especializados.
Inicialmente, é essencial que a profissional reúna provas documentais e testemunhais que comprovem inequivocamente a natureza das atividades por ela desempenhadas ao longo do contrato de trabalho. Isso inclui a apresentação de matérias assinadas, jornais e revistas internas produzidos sob sua responsabilidade, registros de cobertura de eventos corporativos, e-mails funcionais, postagens institucionais no site da empresa, bem como declarações ou testemunhos de colegas de trabalho ou superiores hierárquicos que possam atestar que suas atribuições correspondiam às de uma jornalista, e não às de operadora de telemarketing. Essa etapa é fundamental para a demonstração da primazia da realidade, princípio basilar do Direito do Trabalho que impõe que se reconheça a realidade fática da relação laboral, independentemente do que consta nos documentos formais.

O QUE FAZER QUANDO ESTIVER DE POSSE DAS PROVAS?
Pedro Henrique Curi de Oliveira- De posse dessas provas, a jornalista deve, preferencialmente por meio de advogado especializado, encaminhar notificação extrajudicial à empresa, solicitando a retificação imediata do código da CBO nos registros de admissão, folha de pagamento, termo de rescisão, RAIS, e-Social e demais documentos que contenham a informação incorreta. Tal retificação visa corrigir a distorção formal e resguardar seus direitos presentes e futuros, tanto no âmbito trabalhista quanto previdenciário.
Paralelamente, recomenda-se que a trabalhadora procure o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de sua base territorial, com o objetivo de registrar a ocorrência, obter apoio institucional e requerer eventual intermediação sindical junto à empresa, bem como uma declaração formal do sindicato reconhecendo que as atividades exercidas por ela se enquadram na função jornalística, conforme previsto na regulamentação da categoria e na Classificação Brasileira de Ocupações.

O QUE FAZER SE A EMPRESA NÃO FAZER A CORREÇÃO?
Pedro Henrique Curi de Oliveira- Caso a empresa recuse ou omita-se em promover a correção devida, é plenamente cabível o ajuizamento de reclamação trabalhista, com pedidos que podem incluir: a declaração judicial da função real exercida como jornalista; a determinação de retificação dos registros funcionais e documentos de desligamento; o pagamento de diferenças salariais caso o piso da categoria dos jornalistas seja superior ao que lhe foi pago durante o vínculo; o ressarcimento por prejuízos materiais, como o não recebimento do seguro-desemprego em razão do erro no enquadramento funcional; além da indenização por danos morais, fundamentada no abalo à sua dignidade profissional e na frustração de seus direitos enquanto trabalhadora qualificada.
Ressalte-se que a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho reconhece, de forma reiterada, que o enquadramento funcional inadequado pode ensejar reparação por danos morais e materiais, especialmente quando comprovada a má-fé, a negligência ou a repercussão negativa da conduta patronal na vida profissional do empregado.
Portanto, a jornalista deve agir com celeridade, munida de documentação probatória robusta e assessoria jurídica qualificada, a fim de assegurar a correção da injustiça sofrida, o reconhecimento pleno da sua condição profissional e a reparação integral dos danos decorrentes da conduta irregular da empresa. O Direito do Trabalho, em consonância com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da valorização do trabalho, oferece os instrumentos necessários para a proteção da trabalhadora diante de tal violação.

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