Assessor de imprensa: Impactos de decisão do TST sobre a comunicação corporativa

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Por Santamaria Nogueira Silveira, em 25/6/2019, no Observatório da Imprensa.

Decisão recente da 8ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) – de que a função de assessor de comunicação corporativa não se enquadra como atividade jornalística – promete criar dois pesos e duas medidas quando deveria usar apenas um tipo de peso ou uma só medida para mensurar a questão de forma imparcial.

A linha de separação entre o jornalista de redação e o jornalista produtor de conteúdo corporativo, de acordo com a relatora do TST, é o interesse público. Enquanto o jornalista de redação está comprometido com a verdade dos fatos, o assessor de imprensa, o relações-públicas, o comunicador corporativo e assemelhados visam apenas a defesa dos interesses do cliente, com seleção das informações que serão divulgadas ao público, buscando preservar ou projetar a imagem da empresa (sic).

Na verdade, o grande “nó górdio” da decisão do TST foi ter encerrado com uma canetada uma polêmica que dura décadas no meio jornalístico. Afinal, o assessor de comunicação corporativa é jornalista? Como bem lembra o professor Manuel Chaparro, esse reconhecimento vem quando o Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo cria, em 1980, uma comissão dos jornalistas de assessoria, iniciando o processo para dar identidade jornalística ao assessor de imprensa.

É claro que essa é uma singularidade brasileira. Somente no Brasil as assessorias de imprensa absorveram prioritariamente jornalistas, depois da década de 1970, em grande parte porque eles dominam os processos jornalísticos e também para dar vazão ao encolhimento dos postos de trabalho nas redações dos veículos de comunicação tradicionais.

Nos demais países, o principal profissional em atividade na assessoria de comunicação empresarial é o relações-públicas. A atividade surge com o jornalista americano Ivy Lee, que, em 1914, foi contratado pelo milionário John Rockefeller Jr. para recuperar sua imagem pública, vinculada ao “capitalismo selvagem” depois de uma greve sangrenta em uma de suas empresas – a Colorado Full and Iron Company. O primeiro conselho de Lee para Rockefeller foi falar sempre a verdade, uma atribuição que a relatoria do TST atribui exclusivamente ao jornalista de redação.

Jornalistas defendem o direito à informação, uma conquista social que teve três fases teóricas importantes, segundo a professora. Cremilda Medina, com base em estudo de Siebet e Peterson: a autoritária, a libertária e a da responsabilidade social. Na primeira, abrangendo os séculos XVI e XVII, o liberalismo buscou difundir o conhecimento até então restrito a uma minoria privilegiada. Nessa fase, o interesse dos comerciantes e banqueiros pela divulgação da informação comercial acabou dando impulso à imprensa.

Na fase libertária, havia a preocupação em promover a vigilância do Estado para que não se desviasse de suas funções e a preservação das liberdades individuais, das quais a imprensa era uma extensão. Na fase seguinte, da responsabilidade social, surge a tese do acesso de todos à informação, proposta que se consolidou a despeito das pressões que surgiram com o alto custo do jornal e com o protagonismo da publicidade, suscitando a discussão em torno da ética jornalística.

O direito à informação ganhou grande impulso a partir da Segunda Guerra Mundial, quando os jornalistas americanos lutaram para ter acesso a informações do governo e Kent Cooper, da Associated Press, cunhou o slogan “direito público de saber”, divulgado pela American Society of Newspaper Editors em 1953. Hoje, o direito à informação está contemplado na Constituição Federal do Brasil.

Em uma sociedade que valoriza cada vez mais a transparência, toda empresa precisa ter uma imagem (projeção de sua identidade) identificada com valores positivos. Nessa construção, os jornalistas de redação e de assessoria têm papéis relevantes, pois ambos não podem desertar da verdade, da verificação e da mediação social entre fonte e público, colocando luz sobre o caos dos fatos. A decisão do TST, no entanto, cria duas classes de profissionais da comunicação.

O impacto dessa decisão terá muitas frentes. Uma delas é quanto à aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (13.709/18), que entra em vigor em 2020. De acordo com o art.4º, essa nova lei não se aplica à atividade jornalística. No entanto, o assessor de comunicação corporativa terá de observá-la – já o jornalista de redação poderá ignorá-la. Configura, portanto, o uso de dois pesos e duas medidas para sopesar uma atividade profissional.

Santamaria Nogueira Silveira é jornalista, doutora em Comunicação Social pela ECA-USP e mestre em Literatura pela FFLCH -USP.

(Publicado no Observatório da Imprensa.)

 

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[27/6/19]

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