Feministas e jornalistas no carnaval de luta: porque há flores de resistência

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Pela primeira vez o Bloco Quem Ama Não Mata (QANM) e o Bloco do Pescoção vão sair juntos no carnaval de BH. A afinidade entre a categoria profissional e o movimento feminista no entanto é antiga. Ela vem desde 1980, época de manifestações da sociedade civil contra a ditadura militar no país e do Ato Público realizado por jornalistas, estudantes e professoras universitárias nas escadarias da Igreja São José, quando denunciou a violência sofrida pelas mulheres.

A ditadura militar cairia formalmente em 1985, mesmo ano em que as primeiras delegacias de mulheres, reivindicação das feministas, foram implantadas no país. Em 2018, quase 40 anos depois do Ato na São José, novamente um grupo majoritário de jornalistas organizou um Ato Público contra as variadas formas de violência à mulher, principalmente o feminicídio, quando elas são mortas por sua condição de gênero.

No Brasil, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 16 milhões de mulheres foram agredidas em 2018 – o que significa mais de 500 mulheres agredidas por hora; dessas, 177 sofreram espancamentos. Em 76,4% dos casos, a violência foi cometida por homens com os quais mantinham relações afetivas: cônjuges, ex-cônjuges, companheiros, namorados, amigos, pais e irmãos.

Minas Gerais tem recorde de processos de feminicídio, segundo o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que, inclusive, é parceiro do QANM na campanha “Alalaô Não é Oba Oba. #carnavalsemassédio”. A campanha conclama os foliões para um carnaval sem assédio, como reforça o refrão da Marchinha Quem Ama Não Mata, de autoria da jornalista Mônica Santos, interpretada pela jornalista Mirtes Scalioni.

Registre-se que 2019 será o primeiro carnaval em que a importunação sexual será tratada como crime.

São esses dados que fazem “Quem Ama Não Mata” um slogan de resistência, artisticamente estampado em seu estandarte de inspiração barroca. Nele está a camiseta do Movimento, símbolo maior de luta pela vida e dignidade das mulheres, sobreposta ao tecido lamê, em referência ao ouro velho das Minas Gerais, adornada por flores de fuxico de chita e de patchworks de flores da chita, tecido popular usado ancestralmente pelos escravos, os desvalidos do Brasil Colônia. Assim como a mulher foi tecida pela sociedade patriarcal como “desvalida” social, intelectual e politicamente, como explica a jornalista e pesquisadora de moda e política, Valéria Said, responsável pela concepção político-artístico do estandarte QANM.

“As flores em fuxico de chita representam a sororidade entre as mulheres, as desvalidas da sociedade atual, tratadas como cidadãs de segunda classe, mortas rotineiramente por seus companheiros, sem uma estrutura social para ampará-las, protegê-las. É preciso levantar a bandeira contra toda forma de violência à mulher e exigir respeito às suas liberdades. Por isso, as frases bordadas nas mangas ‘Não É Não’, em referência à campanha nacional contra o assédio na folia, mas que se estende a outras áreas que violam os direitos individuais e constitucionais das mulheres. ‘Não é não para o sexo sem consentimento’; ‘não é não para relacionamentos abusivos’; ‘não é não para a desigualdade de gênero’.”

O Bloco do Pescoção, criado em 2015, cujo nome é um jargão usado por jornalistas para designar o adiantamento, na noite de sexta-feira e início da madrugada de sábado, do fechamento da edição de domingo do jornal, vai levar para o politizado carnaval de BH sua pauta de resistência a toda forma de censura à imprensa, por meio da cultura de samba, como explica um dos idealizadores do Bloco, o jornalista Zuzileison Moreira, o Zu.

“Este ano, o Bloco do Pescoção vai levar uma roda de samba de primeira, formada por Alexandre Rezende (voz), Marina Gomes (voz), Gabriel Goulart “Bidu” (violão), Anderson (cavaco), Nego (pandeiro e caixa), Peterson (repique e tantã), Fabíola (surdo e tantã). E ainda Manu Dias, Mário Moura, Álvaro Ferr e Marcelo Roxo como convidados especiais. Por isso, estamos fazendo uma vaquinha para ajudar a pagar o aluguel do som e os músicos.”

O Pescoção homenageia todos os profissionais que no dia a dia produzem informação para os cidadãos se posicionarem criticamente diante do mundo, principalmente em tempos de fakenews e de aumento do feminicídio.

Assim, feminismo e imprensa se entrelaçam pela união entre o QANM e o Bloco do Pescoção, pois, se nem tudo são flores nas redações e nos ambientes domésticos, no carnaval a luta se expressa de forma lúdica e criativa. Os dois blocos vão se encontrar em frente ao Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais (SJPMG) no dia 5 de março, terça-feira, a partir das 13 horas. No local, serão vendidas camisetas do QANM, que já estão disponíveis no Teatro da Cidade (Rua da Bahia, 1341), por 20 reais.

SERVIÇO
Concentração dos Blocos QANM e Pescoção
Dia: 5 de março de 2019, terça-feira de carnaval
Hora: concentração às 13h; bar aberto a partir das 11h
Local: em frente à Casa do Jornalista (Avenida Álvares Cabral, 400, Centro)

 

#LutaJornalista

#SindicalizaJornalista

[28/2/19]

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