O Tempo encontra o entregador do iFood da foto

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Cena de entregador de aplicativo em meio a temporal retrata precarização 

Wesley Francisco Muniz, 27, trabalha na plataforma enquanto não consegue emprego com carteira assinada

Por Bruno Menezes e Rafaela Mansur

Em meio aos temporais que atingiram Belo Horizonte nas últimas semanas, uma imagem chamou a atenção e viralizou na internet ao retratar, mais do que o caos e a destruição em toda a cidade, um problema social: a precarização do trabalho. A foto de Alexandre Mota, de O Tempo, mostra um entregador de comida por aplicativo ilhado na enchente que atingiu a avenida Prudente de Morais e adjacências, no bairro Cidade Jardim, na região Centro-Sul da capital. Ontem, a reportagem localizou o homem: Wesley Francisco Muniz, 27, um dos 5,5 milhões de brasileiros cadastrados em aplicativos de entrega e transporte, segundo o Instituto Locomotiva.

Enquanto procura um emprego com carteira assinada, essa é a forma que Wesley encontrou para sustentar a família: trabalhar dez horas por dia, de segunda a segunda, faça sol ou chuva, mesmo que seja muita. Minutos antes da foto ser tirada, Muniz havia sido acionado pelo aplicativo para pegar uma entrega em um restaurante a 200 m dali. “Eu parei no posto (de combustível) para fazer a coleta. No momento em que deixei a moto e fui subir a rua, já começou a encher de água. Quando voltei, a água já tinha tomado conta”, diz Wesley, que não conseguiu sequer pegar a encomenda e ficou ilhado.

No momento do registro, ele tentava encontrar uma rota de fuga. Com a ajuda de moradores de prédios vizinhos, Wesley conseguiu sair do local e, mesmo após o sufoco, continuou a trabalhar e ainda fez duas entregas naquela noite, quando em apenas três horas choveu o equivalente a 56% da média de todo o mês de janeiro. “Eu aceito qualquer entrega, mesmo que longe, porque a situação não está fácil”, confessa.

Segundo especialistas, essa forma de trabalho cresce, associada à baixa remuneração e à falta de direitos. “Chego a tirar de R$ 80 a R$ 100 por dia. Estou conseguindo sustentar a família, mas não é uma coisa fixa, não é carteira assinada. Tem riscos e eu gostaria de arrumar um emprego, mas as oportunidades são muito fechadas. Mandei vários currículos e não obtive sucesso”, conta o entregador, que mora em Contagem, na região metropolitana, com a mulher, que está desempregada, e o filho de 4 anos.

Uma pesquisa realizada pela Fundação Instituto Administração (FIA) no ano passado mostra que a maioria dos entregadores de aplicativos no Brasil são homens com escolaridade média. Oito a cada dez são responsáveis pela principal renda da família.

“Existe uma ideia de versatilidade, praticidade e boa adaptação dos horários de trabalho à vida que a pessoa leva, mas, devido ao fato de os rendimentos serem baixos, torna-se um trabalho para sobrevivência”, diz o economista e professor da UFMG Mario Rodarte.

Nesta semana, a Justiça do Trabalho de São Paulo negou um pedido do Ministério Público do Trabalho para que o iFood seja obrigado a reconhecer vínculo trabalhista com entregadores.

O advogado e professor do Ibmec Flávio Monteiro diz que, como não há legislação própria para esse tipo de trabalho, e os entregadores não são reconhecidos como empregados pelas empresas ou pela Justiça, eles não têm nenhum dos direitos trabalhistas previstos na Constituição e na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). “É um trabalho muitas vezes desgastante. Para a pessoa conseguir ganhar um dinheiro para sustentar a família tem que trabalhar em jornadas muito longas”, afirma.

Em nota, o iFood informou que atualmente há cerca de 80 mil entregadores ativos na plataforma, “que atuam de forma independente e tem flexibilidade para gerenciar seu próprio tempo”. Em casos de acidentes, eles contam com seguro acidente pessoal. A empresa disse que vem desenvolvendo ações que incentivam boas práticas de segurança por meio de vídeos educativos.

Clique AQUI para ler a íntegra no O Tempo.

(Crédito da foto: Ramon Bitencourt / O Tempo.)

[31/1/20]

 

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