A reestruturação da Editora Abril

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No cardápio de mudanças, uma reestruturação radical na área comercial, redução do portfólio de publicações (venda de sete títulos e descontinuação de outros três na plataforma impressa) e fim das unidades de negócios

Foram muitas as reestruturações no Grupo Abril na última década e sobretudo nos últimos anos. A mais recente, em agosto passado, já sinalizava um caminho sem volta para a empresa: enxugar a estrutura e repensar o negócio. Naquela ocasião, as medidas mais visíveis foram a entrega de metade do prédio que ocupava na Marginal Pinheiros, zona oeste de São Paulo, e a transferência de dez títulos para a Editora Caras.

Nenhuma, no entanto, teve a profundidade e a dimensão desta que acaba de ser anunciada, que transforma a sessentona Editora Abril numa jovem start-up, iniciando quase do zero seu novo posicionamento no mercado: abandona o perfil de editora que vive das receitas de suas publicações (publicidade, assinaturas e vendas avulsas de exemplares) pelo de uma empresa que vende soluções customizadas para o mercado anunciante, nelas incluídas, sim, as publicações, mas também adicionalmente tudo o que, ligado às marcas e aos conteúdos da Abril, possa atingir e impactar o público desejado e gerar benefícios aos negócios, em diferentes linguagens, plataformas e ambientes.

Já não importa para a empresa ser uma editora de revistas, ainda que a maior do Brasil e uma das maiores do mundo. Ela sabe que esse mundo está ruindo e que se não mudasse o foco dos negócios ruiria com ele e por isso decidiu dar uma guinada e uma nova forma ao seu negócio.

Ela quer e vai se empenhar em vender sua expertise e seus conteúdos sob medida para os mais de 70 milhões de consumidores que fazem parte de seu imenso e valioso banco de dados, agora transformado em Abril Big Data, ou ABD. E o fará a partir do uso inteligente desse banco, vendendo soluções sob medida para a audiência desejada, ou seja, para o perfil de público que o anunciante quer atingir, e nas linguagens, plataformas e frequência desejadas.

Nesse novo posicionamento não há necessidade de tantos títulos, pois o que importa é a múltipla capacidade de negócios e a rentabilidade do portfólio mantido.

A prova maior do novo olhar de mercado da Editora Abril é que a empresa está se despedindo de outros dez de seus tradicionais títulos, sete deles vendidos para a Editora Caras, esta, sim, apostando nesse mercado, talvez por conseguir custos de produção mais competitivos (os títulos que para lá migram são Contigo, Placar, Você S/A, Você RH, Tititi, Ana Maria e Arquitetura & Construção) e três descontinuados na plataforma impressa (Exame PME, que volta a ser coberta pela nave mãe Exame; Capricho, que passa a ser exclusivamente digital, como seu público de jovens garotas nativas digitais; e o Guia Quatro Rodas, cujo conteúdo será absorvido pelas Vejinhas e por Viagem e Turismo).

Pelo que apurou o Portal dos Jornalistas, os dez títulos que deixam o portfólio da Abril tinham pouco menos de 100 profissionais. Mas estima-se que deixam a empresa cerca de 2% de seus atuais seis mil funcionários, o que totalizaria 120 demissões. As equipes dos títulos ora comprados pela Editora Caras devem, em tese, seguir para a nova empresa, caso obviamente haja acordo entre as partes. Há ainda a interferência do Sindicado dos Jornalistas no processo, buscando evitar novas demissões a partir da mobilização dos profissionais e de negociações com a empresa. Somente nos próximos dias é que se terá um cenário mais claro sobre o impacto real das mudanças.

Foram quase quatro meses de um profundo mergulho da equipe liderada pelo presidente Alexandre Caldini e da consultoria que apoiou a empresa naquilo que eles entendiam deveria ser a Abril do futuro. E apenas nas duas últimas semanas é que os formatos finais – ou os nomes das caixinhas – foram definidos.

“Quando fui chamado de volta pela Abril”, conta Caldini, “tinha dois desafios: o primeiro era arrumar a casa e o segundo, reestruturar a empresa direcionando-a para o futuro. Fizemos a adequação da estrutura inicialmente e agora partimos para alterar de forma radical o mindset da empresa. E o fizemos partindo do zero, pensando de fato uma nova estrutura de negócios para a empresa. Uma estrutura compatível com o novo tempo, com os novos hábitos de consumo, com as novas e revolucionárias tecnologias”.

De fato, essa nova Abril tem pouco ou quase nada a ver com a Abril de até agora, a não ser pela marca de excelência que sempre a caracterizou, desde que aqui chegou, nos anos 1950.

Três pilares

Os três pilares em que ela passa a se apoiar são Receitas, Marketing e Conteúdo, sendo que as mudanças mais radicais atingem a de Receitas, que deixa de se ater exclusivamente à comercialização de publicidade por núcleo editorial e passa a vender soluções em toda a audiência da Abril, em produtos existentes ou nos que venham a ser criados. E aí todo o trabalho de reciclagem profissional será conduzido pela Universidade de Vendas Abril.

Receitas, aliás, é a unidade que controla todo o faturamento da Editora (publicidade, assinaturas, vendas avulsas, e-commerce, digital e eventos), conforme informa o comunicado distribuído pela empresa na tarde desta 3ª.feira (2/6).

Diz o comunicado: “Essa unidade será comandada por Rogério Gabriel Comprido, que assume a posição de diretor Comercial. Gabi, como é conhecido, terá no seu time duas lideranças: Virginia Any e Dimas Mietto. Virginia será responsável por toda a receita publicitária da Abril, assumindo a posição de diretora de Vendas de Publicidade. Respondem a ela gestores focados nos seis principais segmentos de mercado – Bens de Consumo; Financeiro; Moda, Decoração e Construção; Saúde, Educação, Cultura, Lazer e Esporte; Tecnologia, Serviços Públicos e Sociais; Transporte e Mobilidade; além dos escritórios regionais e da área internacional. Cada um desses gestores de segmento tem por missão conhecer profundamente o setor, seus desafios e seus principais players. A ideia é que a Abril, conhecendo as necessidades desses clientes, possa atendê-los de forma diferenciada, flexível e, sobretudo, eficiente, em diversos formatos, mídias e linguagens. Dimas assume a posição de diretor de Vendas para Audiência. Ele será responsável por toda a receita originária dos consumidores Abril. Estão sob sua responsabilidade as áreas de Assinaturas, Vendas Avulsas, Venda de Acervo e e-commerce. Continuam a responder a Dimas todos os diretores dos canais de assinaturas, além de dois gestores responsáveis por vendas avulsas”.

“Será um trabalho de fôlego, porque mexerá com a cultura de nosso time atual de vendas, mas em alguns meses creio que estaremos afinados com esse novo posicionamento, pois ele é coerente com o que as empresas buscam. E se isso é o que mercado quer, isso é o que teremos de oferecer”, assinala Caldini.

A Unidade de Marketing será comandada por Tiago Afonso, que assume a posição de diretor de Marketing. Afonso terá a responsabilidade de gerenciar o portfólio de marcas e produtos e identificar tendências de mercado. Respondendo a ele estarão os gestores das marcas e as áreas de Informações para o Mercado, Abril Big Data (ABD) e Serviços de Marketing e Eventos.

O núcleo Editorial assume um formato muito mais simples que os das UNs – Unidades de Negócios que por anos dominaram a cena nas redações da Abril e que a cada período passavam por mudanças, com revistas migrando de um núcleo para outro, cada vez com um lógica própria. Na nova estrutura são quatro os grupos editoriais: Veja, conduzido por Eurípedes Alcântara (que perde as Vejinhas); Exame, sob o comando de André Lahoz; Femininas (Boa Forma, Claudia, Capricho.com, Casa Claudia, Claudia, Cosmopolitan, Elle, Estilo e a plataforma digital M de Mulher), com Paula Mageste; e Lifestyle (Brasil Post, Elástica, Guia do Estudante, Info.com, Men’s Health, Mundo Estranho, National Geographic, Playboy, Quadrinhos, Quatro Rodas, Saúde, Superinteressante, Veja SP, Veja Rio, Viagem e Turismo, VIp e Women’s Health), com Alecsandra Zaparolli. Todos passam a se reportar diretamente a Victor Civita Neto, presidente do Conselho Editorial.

Com as mudanças, acontecem dois movimentos importantes e estratégicos: 1. Os diretores editoriais passam a se concentrar exclusivamente no seu papel de produção de conteúdo editorial e nas relações entre as marcas e suas comunidades; 2. Todas as redações da Abril passam a trabalhar com total convergência na produção de conteúdo on e offline, em diversos formatos de texto, audiovisual e eventos.

Adicionalmente, essa estrutura da Abril contempla uma nova unidade operacional: o Estúdio ABC (de Abril Branded Content), dirigido por Edward Pimenta e que tem entre seus gestores Kátia Militello, em Negócios e Tecnologia, Dagmar Serpa, em Comportamento, Medicina e Saúde, e Matthew Shirts, no Planeta Sustentável. O Estúdio ABC atuará na coordenação, atendimento e produção de conteúdos customizados, como native advertising ou qualquer outro tipo de content marketing, em todos os formatos, incluindo uma estrutura exclusiva para a produção de vídeos.

Nesse novo posicionamento da Abril, as três unidades criadas (Conteúdo, Marketing e Receitas) respondem ao presidente Alexandre Caldini. Já a linha editorial segue ligada ao Conselho Editorial, formado por Victor Civita Neto (presidente), Thomaz Souto Corrêa (Vice-Presidente), José Roberto Guzzo, Giancarlo Civita e Eurípedes Alcântara.

A área Digital & Mobile permanece ligada diretamente a Caldini, sob o comando de Sandra Carvalho, que tem como missão garantir a execução da estratégia digital e apoiar tecnicamente a produção e a distribuição de conteúdo para clientes. Também Casa Cor segue respondendo diretamente ao presidente, com Lívia Pedreira à frente do negócio.

(Publicado pelo Portal dos Jornalistas, em 3/6/15. )

 

 

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